Diferente daquilo que muitos pensam e ensinam, o ministério profético não deixou de existir com o advento do Novo Testamento.
"A Lei e os Profetas duraram até João; desde então, é anunciado o Reino de Deus, e todo homem emprega força para entrar nele". (Lc 16.16, grifo nosso)
O texto acima costuma ser interpretado como o final do ministério profético no Novo Testamento, quando na realidade, os termos Lei e Profeta nos falam da totalidade do Antigo Testamento, que não seria mais a mensagem central "anunciada" na Nova Aliança. Os princípios do Evangelho do Reino é que passariam a reger a vida dos discípulos de Jesus, que deveriam proclamá-los e ensiná-los a todas as pessoas, em todos os lugares (Mt 4.23; 24.14). Morris (1983, 236) afirma: "A vinda de Jesus marcava uma linha divisória. Até então, a revelação de Deus tinha sido feita na lei (a rigor: os livros de Gênesis até Deuteronômio) e os profetas. A expressão combinada representa a totalidade do Antigo Testamento."
O Comentário Bíblico Pentecostal do Novo Testamento (2003, p. 426, CPAD), sobre o presente versículo especifica que:
"Reconhecendo o desafio à sua autoridade, Jesus passa a traçar a origem de sua autoridade e a delinear sua devoção superior à lei. Ele apresenta 'a Lei e os Profetas' (i.e., o Antigo Testamento) e a pregação de João Batista como unidade (v. 16). João anunciou a vinda de uma nova era e participou dela. É 'desde então' (v.16), quer dizer, começando com João, que o Reino de Deus é pregado. O ponto que Jesus deseja chegar é que nem João nem os profetas do Antigo Testamento são necessários para confirmar o outro, mas que ambos servem de precursores, levando à pregação de Jesus acerca das boas novas do Reino de Deus."
Observe que o comentarista expressa que o texto de Lc 16.16 não declara o fim do ministério profético, mas sim, o início da pregação do Evangelho do Reino. A Lei e os Profetas representam o Antigo Testamento.
Na versão da Bíblia Almeida e Atualizada (ARA), Lc 16.16 foi traduzido da seguinte forma: "A Lei e os Profetas vigoraram até João; desde esse tempo , vem sendo anunciado o evangelho do reino de Deus, e todo homem se esforça para entrar nele. (grifo nosso)"
Observe que o verbo "duraram" da Almeida Revista e Corrigida (ARC), foi substituído por "vigoraram" na ARA, deixando mais clara a alusão ao texto do Antigo Testamento (Lei e Profetas).
O texto de Mateus 11.13, na ARC declara: "Porque todos os profetas e a lei profetizaram até João."
O mesmo texto na ARA está escrito da seguinte forma: "Porque todos os Profetas e a Lei profetizaram até João."
Aparentemente parece uma bobagem, mas perceba que na ARC os termos "profetas" e "lei" estão escritos com iniciais minúsculas, enquanto na ARA, com maiúsculas. Isso faz uma grande diferença, pois os termos com iniciais maiúsculas identificam uma forma específica de entender "Profetas e Lei", e essa forma nos fala exatamente do sentido real da expressão, no que diz respeito à totalidade das escrituras do Antigo Testamento.
O Comentário Bíblico Pentecostal do Novo Testamento(Idem, p. 81), diz sobre o versículo acima que: "Mateus viu que a divisão entre a velha era e a nova era um acontecimento que se deu ao término do ministério de João Batista e começo do ministério de Jesus."
Perceba no versículo que "os profetas e a lei profetizaram", é uma clara alusão à totalidade do Antigo Testamento enquanto texto sagrado, que até então era a base e o referencial de toda mensagem profética.
Tanto em Mateus 11.13, como em Lc 16.16, os termos gregos para profetas é prophetai, e para lei, nómos.
De forma clara e objetiva, o que fica aqui evidente, é que o ministério profético foi uma realidade presente nas narrativas e ensinos do Novo Testamento, e ainda continua sendo uma realidade em nossos dias (não se encerrou com João Batista). A prova disto?
- O próprio Jesus continuou exercendo o ministério profético após João Batista, falando em nome do Pai (Jo 4.34; 5.30; 6.38; 14.24). Um claro exemplo de mensagem profética no Novo Testamento são as cartas às sete igrejas em Apocalipse 2 e 3, marcadas por denúncias, alertas, advertências e um convite ao arrependimento, para se livrar do juízo iminente.
- O livro de Atos nos apresenta profetas: "Naqueles dias, desceram profetas de Jerusalém para Antioquia. E levantando-se um deles, por nome Ágabo, dava a entender, pelo Espírito, que haveria uma grande fome em todo o mundo, e isso aconteceu no tempo de Claúdio César." (At 11.27-28, ARC). E ainda: "E, demorando-nos ali por muitos dias, chegou da Judéia um profeta, por nome Ágabo; e vindo ter conosco, tomou a cinta de Paulo e, ligando-se os seus próprios pés e mãos, disse: Isto diz o Espírito Santo: Assim ligarão os judeus, em Jerusalém, o varão de quem é esta cinta e o entregarão nas mãos dos gentios." (At 21.10-11).
- "Na igreja que estava em Antioquia havia alguns profetas (prophetai) e doutores (didaskaloi) [...]." (At 13.1, ARC)
- O ministério profético foi manifesto na vida de Paulo (At 20.29-30; 1 Tm 4.1; 1 Ts 4.13-17).
- O ministério profético foi evidenciado nos escritos de Pedro(2 Pe 2.1-3; 3.3,4, 7-18).
- Entre os chamados dons ministeriais de Efésios 4.11, está o de profeta (gr. prophetas)
A Bíblia de Estudo Pentecostal (1995, p. 1814-1815, CPAD), em seu estudo doutrinário sobre o ministério de profeta (Ef 4.11), sustenta a atualidade deste na igreja, fazendo as seguintes afirmações:
- Os profetas eram homens que falavam sob o impulso direto do Espírito Santo, e cuja motivação e interesses principais eram a vida espiritual e pureza da igreja. Sob o novo concerto, foram levantados pelo Espírito Santo e revestidos pelo seu poder para trazerem uma mensagem da parte de Deus ao seu povo (At 2.17; 4.8; 21.4).
- O ministério profético do AT ajuda-nos a compreender o do NT. A missão principal dos profetas do AT era transmitir a mensagem divina através do Espírito, para encorajar o povo de Deus e permanecer fiel, conforme os preceitos da antiga aliança. Às vezes eles também prediziam o futuro conforme o Espírito lhes revelava [...]. Cristo e os apóstolos são um exemplo do ideal do AT (At 3.22, 23; 13.1,2).
- A função do profeta na igreja incluía o seguinte: (a) Proclamava e interpretava, cheio do Espírito Santo, a Palavra de Deus, por chamada divina. Sua mensagem visava admoestar exortar, animar, consolar e edificar (At 2.14-36; 3.12-26; 1 Co 12.10; 14.3). (b) Devia exercer o dom de profecia [...]. (c) às vezes, ele era vidente (cf. 1 Cr 20.29), predizendo o futuro (At 11.28; 21.10,11). (d) Era dever do profeta do NT, assim como para o AT, desmascarar o pecado, proclamar a justiça, advertir do juízo vindouro e combater o mundanismo e frieza espiritual entre o povo de Deus (Lc 1.14-17). Por causa da sua mensagem de justiça, o profeta pode esperar ser rejeitado por muitos nas igrejas, em tempos de mornidão e apostasia.
- A mensagem do profeta atual não deve ser considerada infalível. Ela está sujeita ao julgamento da igreja, doutros profetas e da Palavra de Deus. A congregação tem o dever de discernir e julgar o conteúdo da mensagem profética, se ela é de Deus (1 Co 14.29-33; 1 Jo 4.1).
- Os profetas continuam sendo imprescindíveis ao propósito de Deus para a igreja. A igreja que rejeitar os profetas de Deus caminhará para a decadência, desviando-se para o mundanismo e o liberalismo quanto aos ensinos da Bíblia (1 Co 14.3; cf. Mt 23.31-38; Lv 11.49; At 7.51,52). [...] a igreja com os seus dirigentes, tendo a mensagem dos profetas de Deus, será impulsionada à renovação espiritual. O pecado será abandonado, a presença e a santidade do Espírito serão evidentes entre os fiéis (1 Co 14.3; 1 Ts 5.19-21; Ap 3.20-22).
Em seu livro "A Igreja e as Sete Colunas da Sabedoria", publicado atualmente pela CPAD, o pastor Severino Pedro, escrevendo sobre o ministério profético na atualidade, relata que:
"João Batista o último profeta da Dispensação da Lei, entra em o Novo Testamento como profeta de grande poder. Porém, nele é, sem dúvida encerrado este ofício de acordo com o estilo e norma da Antiga Aliança. Jesus disse: 'A lei e os profetas duraram até João...' (Lc 16.16). Agora em Jesus e através de Jesus, se inicia uma 'Nova Ordem Ministerial', composta pelos profetas do Ministério do Espírito Santo'".
Fundamentado na exposição que fiz no início deste subsídio, e nas citações da Bíblia de Estudo Pentecostal, discordo parcialmente e respeitosamente da citação acima, visto entender que a diferença entre o ministério profético do AT e do NT não está na mudança de "estilo" e da "norma" da Antiga Aliança, ou seja, não se encontra na práxis, ou na característica da atividade do profeta enquanto estilo e forma de ser, mas, na mudança do conteúdo prioritário e referencial de sua mensagem, que deixa de ser a Lei e os Profetas (Antiga Aliança), para ser norteada pelo ensino e pregação de Jesus sobre o Evangelho do Reino (Nova Aliança), mensagem e ensinos estes expandidos em Atos e nas epístolas pelos escritores do Novo Testamento.
Dessa forma, concluímos que o ministério profético na igreja, não é apenas uma realidade atual, mas, acima de tudo, uma extrema e vital necessidade nestes tempos trabalhosos ou difíceis (gr. kairoí chalepoí, 2 Tm 3.1).
Que o Senhor:
" [...] vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele,iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes qual é a esperança do seu chamamento, qual a riqueza da glória da sua herança nos santos e qual a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficácia da força do seu poder;" (Ef 1.17-19)
REFERÊNCIAS
- A Igreja e as Sete Colunas da Sabedoria, Severino Pedro.
- Assim diz o Senhor? Como saber quando Deus está falando com você através de alguém, John Bevere.
- Bíblia de Estudo Pentecostal, CPAD.
- Bíblia de Estudo Almeida, SBB.
- Comentário Bíblico Pentecostal Novo Testamento, L. Arrington e Roger Stronstad.
- Novo Testamento Interlinear, Vilson Scholz.
- Lições Bíblicas, 3º Trimestre de 2010, CPAD.
- Lucas: Introdução e comentário, Leon L. Morris.
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